Introdução
A Norma Regulamentadora nº 1 (NR1), intitulada “Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Ocupacionais”, representa um marco fundamental na legislação trabalhista brasileira. Originalmente editada pela Portaria MTb nº 3.214, de 8 de junho de 1978, esta norma estabelece as diretrizes basilares que orientam todas as demais normas regulamentadoras relacionadas à segurança e saúde no ambiente laboral. Ao longo das décadas, a NR1 passou por diversas atualizações para acompanhar as transformações nas relações de trabalho, culminando em sua versão mais recente, que traz inovações significativas, especialmente no que tange à saúde mental dos trabalhadores.
O presente artigo busca analisar a NR1 sob uma perspectiva dupla: jurídica e humana. Por um lado, examinaremos os aspectos legais, obrigações e responsabilidades estabelecidos pela norma; por outro, abordaremos os impactos humanos dessas disposições, com ênfase nas recentes alterações que incorporam a gestão de riscos psicossociais no ambiente de trabalho. Esta abordagem integrada visa proporcionar uma compreensão holística da norma, evidenciando não apenas seu caráter técnico-jurídico, mas também sua dimensão humanística e seu potencial transformador nas relações laborais contemporâneas.
Contextualização Histórica e Evolução Normativa
A NR1 nasceu em um contexto de industrialização crescente no Brasil, quando se tornou imperativa a criação de mecanismos legais para proteger a integridade física dos trabalhadores. Sua primeira versão, de 1978, estabelecia disposições gerais relativamente simples, focadas principalmente em riscos físicos e acidentes de trabalho. Ao longo dos anos, a norma passou por diversas atualizações, refletindo a evolução da compreensão sobre saúde e segurança ocupacional.
Entre as principais alterações, destacam-se as realizadas pelas Portarias SSMT nº 06 (1983), SSMT nº 03 (1988), SSST nº 13 (1993), SIT nº 84 (2009), SEPRT nº 915 (2019), SEPRT nº 6.730 (2020), SEPRT nº 1.295 (2021), SEPRT nº 8.873 (2021), MTP nº 4.219 (2022) e, mais recentemente, as Portarias MTE nº 342 e nº 344, ambas de 21 de março de 2024. Cada uma dessas atualizações trouxe refinamentos e ampliações no escopo da norma, culminando na versão atual que incorpora conceitos contemporâneos de gestão de riscos ocupacionais.
A evolução da NR1 reflete uma mudança paradigmática na concepção de saúde e segurança no trabalho: de uma abordagem predominantemente reativa, focada na correção de problemas após sua ocorrência, para uma perspectiva preventiva e sistêmica, que busca antecipar e gerenciar riscos de forma proativa. Esta transformação acompanha o desenvolvimento do próprio Direito do Trabalho, que progressivamente incorporou princípios de dignidade humana e valorização social do trabalho, consagrados na Constituição Federal de 1988.
Aspectos Jurídicos da NR1 Atualizada
Objetivo e Campo de Aplicação
Conforme estabelecido no item 1.1.1 da norma atualizada, “o objetivo desta Norma é estabelecer as disposições gerais, o campo de aplicação, os termos e as definições comuns às Normas Regulamentadoras – NR relativas a segurança e saúde no trabalho e as diretrizes e os requisitos para o gerenciamento de riscos ocupacionais e as medidas de prevenção em Segurança e Saúde no Trabalho – SST.”
Quanto ao campo de aplicação, a NR1 é clara ao estabelecer, no item 1.2.1, que “as NR obrigam, nos termos da lei, empregadores e empregados, urbanos e rurais.” Adicionalmente, o item 1.2.1.1 estende essa obrigatoriedade às “organizações e pelos órgãos públicos da administração direta e indireta, bem como pelos órgãos dos Poderes Legislativo, Judiciário e Ministério Público, que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.”
Esta abrangência ampla demonstra a intenção do legislador de universalizar as normas de segurança e saúde no trabalho, alcançando praticamente todas as relações laborais formalizadas no país. Tal extensão reflete o princípio constitucional da isonomia, ao garantir proteção equivalente a trabalhadores de diferentes setores e vínculos empregatícios.
Competências e Estrutura
A NR1 estabelece uma estrutura de competências e responsabilidades bem definida. Ao empregador, cabe implementar e zelar pelo cumprimento das medidas de segurança e saúde no trabalho, enquanto aos trabalhadores compete colaborar com a empresa na aplicação dessas normas. Esta distribuição de responsabilidades reflete o princípio da cooperação entre as partes da relação laboral, essencial para a efetividade das medidas de proteção.
A norma também prevê a participação de órgãos como a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) e o Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), que desempenham papéis fundamentais na implementação e fiscalização das medidas de segurança e saúde. Esta estrutura organizacional visa garantir que as questões de SST sejam tratadas de forma técnica e especializada, com a participação de profissionais qualificados.
Gerenciamento de Riscos Ocupacionais
Um dos aspectos mais inovadores da NR1 atualizada é a introdução do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), que substitui os antigos programas de prevenção. O PGR representa uma abordagem sistêmica e integrada para a identificação, avaliação e controle dos riscos ocupacionais, incluindo não apenas riscos físicos, químicos e biológicos, mas também, a partir das atualizações mais recentes, os riscos psicossociais.
O item 1.5 da norma detalha os requisitos para o gerenciamento de riscos ocupacionais, estabelecendo que este deve constituir um processo contínuo e estruturado de prevenção e controle. Entre os elementos essenciais deste processo estão:
- Antecipação e reconhecimento dos riscos;
- Avaliação dos riscos identificados;
- Controle dos riscos;
- Monitoramento da eficácia das medidas implementadas;
- Registro e documentação do processo.
Esta abordagem processual e sistemática representa um avanço significativo em relação às versões anteriores da norma, que frequentemente se limitavam a estabelecer requisitos formais sem necessariamente promover uma cultura de prevenção efetiva.
Direitos e Deveres
A NR1 estabelece um conjunto claro de direitos e deveres para empregadores e trabalhadores. Aos empregadores, cabe a responsabilidade primária pela implementação das medidas de segurança e saúde, incluindo:
- Implementar o Programa de Gerenciamento de Riscos;
- Garantir a capacitação dos trabalhadores;
- Fornecer equipamentos de proteção adequados;
- Manter documentação atualizada sobre as medidas implementadas.
Aos trabalhadores, por sua vez, compete:
- Colaborar com a empresa na implementação das normas de segurança;
- Utilizar adequadamente os equipamentos de proteção fornecidos;
- Informar ao empregador sobre situações de risco;
- Participar dos programas de capacitação oferecidos.
Esta distribuição equilibrada de responsabilidades reflete o princípio da cooperação entre as partes da relação laboral, essencial para a efetividade das medidas de proteção.
A Inovação dos Riscos Psicossociais na NR1
Contextualização da Mudança
A inclusão dos riscos psicossociais no escopo da NR1 representa uma das mais significativas inovações da norma em sua história recente. Esta mudança, oficializada pela Portaria MTE nº 1.419, publicada em 27 de agosto de 2024, reflete o reconhecimento crescente da importância da saúde mental no ambiente de trabalho e sua indissociabilidade da saúde física.
A decisão de incorporar os riscos psicossociais na norma não foi fortuita, mas resultado de um processo de amadurecimento da compreensão sobre saúde ocupacional, influenciado por evidências científicas, pressões sociais e tendências internacionais. Países como Colômbia (desde 2012) e diversas nações europeias já haviam incorporado a gestão desses riscos em suas legislações trabalhistas, colocando o Brasil em um movimento de alinhamento com práticas internacionais avançadas.
Definição e Escopo dos Riscos Psicossociais
Conforme a atualização da NR1, os riscos psicossociais são definidos como aqueles que podem afetar a saúde mental dos trabalhadores, incluindo fatores como:
- Assédio moral e sexual;
- Pressão excessiva por metas e resultados;
- Jornadas extenuantes;
- Desequilíbrio entre vida pessoal e profissional;
- Falta de autonomia e controle sobre o trabalho;
- Relações interpessoais conflituosas no ambiente laboral;
- Insegurança no emprego.
Esta definição ampla reconhece a multiplicidade de fatores que podem impactar a saúde mental dos trabalhadores, superando visões reducionistas que frequentemente limitavam a saúde ocupacional a aspectos físicos e ergonômicos.
Implementação e Prazos
A implementação das novas exigências relacionadas aos riscos psicossociais seguirá um cronograma específico. Conforme decisão do Ministério do Trabalho, a norma entrará em vigor em 26 de maio de 2025, mas a fiscalização será apenas orientativa durante os primeiros 12 meses — ou seja, até o fim de maio de 2026, o não cumprimento das novas exigências não acarretará autuação.
Este período de adaptação visa permitir que as empresas se preparem adequadamente para as novas exigências, desenvolvendo competências internas, revisando processos e implementando medidas preventivas. Durante este período, os fiscais do trabalho atuarão como agentes educativos, orientando as empresas sobre como se adequar às novas diretrizes.
Adicionalmente, o Ministério do Trabalho anunciou a criação de um grupo de trabalho tripartite, com representantes do governo, empregadores e trabalhadores, para acompanhar a implementação da norma. Este grupo terá a função de monitorar o processo de adaptação, identificar dificuldades e propor ajustes quando necessário.
Impactos Humanos e Organizacionais
Transformação da Cultura Organizacional
A incorporação dos riscos psicossociais na NR1 não representa apenas uma mudança normativa, mas um potencial catalisador para transformações profundas na cultura organizacional das empresas brasileiras. Ao reconhecer formalmente a importância da saúde mental no ambiente de trabalho, a norma incentiva o desenvolvimento de culturas organizacionais mais humanizadas, que valorizam o bem-estar integral dos trabalhadores.
Esta transformação cultural implica em repensar práticas de gestão tradicionalmente focadas exclusivamente em resultados, incorporando critérios de saúde e bem-estar nas decisões gerenciais. Lideranças passam a ser avaliadas não apenas por sua capacidade de gerar resultados financeiros, mas também por sua habilidade em promover ambientes de trabalho saudáveis e sustentáveis.
Impactos na Saúde dos Trabalhadores
Os potenciais benefícios da nova abordagem para a saúde dos trabalhadores são significativos. Estudos internacionais demonstram que a gestão adequada dos riscos psicossociais está associada a reduções nas taxas de absenteísmo, presenteísmo, rotatividade e afastamentos por transtornos mentais como depressão, ansiedade e síndrome de burnout.
No contexto brasileiro, onde os transtornos mentais já figuram entre as principais causas de afastamento do trabalho, a implementação efetiva das novas diretrizes pode representar um avanço significativo na saúde pública. Segundo dados da Previdência Social, os transtornos mentais e comportamentais são a terceira causa de concessão de benefícios por incapacidade, evidenciando a relevância do tema.
Além dos impactos diretos na saúde mental, a gestão adequada dos riscos psicossociais pode contribuir para a redução de doenças físicas associadas ao estresse crônico, como hipertensão, doenças cardiovasculares e distúrbios musculoesqueléticos, demonstrando a interconexão entre saúde física e mental.
Desafios para Implementação
Apesar dos potenciais benefícios, a implementação efetiva das novas diretrizes enfrenta desafios significativos. Entre eles, destacam-se:
- Capacitação técnica: Muitas empresas, especialmente as de menor porte, carecem de profissionais com conhecimento específico sobre riscos psicossociais e sua gestão.
- Resistência cultural: A cultura organizacional predominante em muitas empresas brasileiras ainda valoriza excessivamente a “resiliência” e a capacidade de trabalhar sob pressão, normalizando ambientes potencialmente adoecedores.
- Complexidade da avaliação: Diferentemente dos riscos físicos, que frequentemente podem ser medidos objetivamente, os riscos psicossociais envolvem elementos subjetivos e contextuais, tornando sua avaliação mais complexa.
- Custos de implementação: A implementação de programas efetivos de gestão de riscos psicossociais pode envolver investimentos significativos, especialmente para pequenas e médias empresas com recursos limitados.
- Integração com outras políticas: Para ser efetiva, a gestão dos riscos psicossociais deve estar integrada com outras políticas organizacionais, como gestão de desempenho, desenvolvimento de lideranças e políticas de diversidade e inclusão.
Superar estes desafios exigirá um esforço coordenado entre empresas, trabalhadores, entidades representativas e órgãos governamentais, com foco no desenvolvimento de capacidades, compartilhamento de boas práticas e criação de incentivos adequados.
Aspectos Práticos para Adequação à Norma
Etapas para Implementação do Gerenciamento de Riscos Psicossociais
Para se adequar às novas exigências da NR1, as organizações devem seguir um processo estruturado de gerenciamento de riscos psicossociais, que pode ser organizado nas seguintes etapas:
- Identificação dos fatores de risco: Mapear os fatores organizacionais e relacionais que podem constituir riscos psicossociais, como práticas de gestão, organização do trabalho, relações interpessoais e políticas de recursos humanos.
- Avaliação dos riscos: Analisar a probabilidade e o potencial impacto dos riscos identificados, considerando fatores como frequência, intensidade e número de trabalhadores expostos.
- Desenvolvimento de medidas preventivas: Elaborar e implementar ações para eliminar ou mitigar os riscos identificados, priorizando medidas coletivas sobre individuais.
- Monitoramento e revisão: Estabelecer mecanismos para monitorar continuamente a eficácia das medidas implementadas e revisar o processo quando necessário.
- Documentação: Registrar adequadamente todas as etapas do processo, mantendo evidências das ações realizadas e resultados obtidos.
Este processo deve ser conduzido com a participação ativa dos trabalhadores e suas representações, garantindo que diferentes perspectivas sejam consideradas e que as medidas implementadas sejam adequadas às necessidades reais.
Ferramentas e Metodologias
Diversas ferramentas e metodologias podem auxiliar as organizações na implementação do gerenciamento de riscos psicossociais, incluindo:
- Questionários e escalas validadas: Instrumentos como o Copenhagen Psychosocial Questionnaire (COPSOQ) e o Health and Safety Executive Management Standards Indicator Tool (HSE-MS IT) podem fornecer dados estruturados sobre a percepção dos trabalhadores.
- Grupos focais e entrevistas: Abordagens qualitativas que permitem explorar em profundidade as experiências e percepções dos trabalhadores sobre os fatores de risco.
- Análise de indicadores organizacionais: Dados como taxas de absenteísmo, rotatividade, afastamentos por transtornos mentais e resultados de pesquisas de clima podem fornecer insights valiosos sobre potenciais problemas.
- Observação sistemática: Observação estruturada das práticas de trabalho e interações no ambiente laboral, identificando padrões problemáticos.
A escolha das ferramentas e metodologias deve considerar as características específicas da organização, como porte, setor de atuação, perfil dos trabalhadores e recursos disponíveis.
Papel dos Diferentes Atores
A implementação efetiva do gerenciamento de riscos psicossociais requer o envolvimento coordenado de diferentes atores organizacionais:
- Alta direção: Deve demonstrar compromisso visível com a saúde mental, alocando recursos adequados e integrando a gestão de riscos psicossociais na estratégia organizacional.
- Gestores e lideranças: Responsáveis por implementar práticas de gestão saudáveis, identificar sinais precoces de problemas e apoiar trabalhadores em dificuldade.
- Profissionais de saúde e segurança: Fornecem expertise técnica para a identificação e avaliação dos riscos, além de orientar sobre medidas preventivas adequadas.
- Recursos humanos: Integram a gestão de riscos psicossociais com outras políticas de gestão de pessoas, como recrutamento, desenvolvimento e gestão de desempenho.
- Trabalhadores e representantes: Participam ativamente do processo, compartilhando percepções, sugerindo melhorias e monitorando a implementação das medidas.
Esta abordagem multidisciplinar e participativa é essencial para garantir que o gerenciamento de riscos psicossociais seja efetivo e sustentável, promovendo mudanças reais nas condições de trabalho.
Perspectivas Futuras e Tendências
Evolução da Legislação e Fiscalização
A incorporação dos riscos psicossociais na NR1 representa não um ponto de chegada, mas o início de um processo de evolução normativa que provavelmente se intensificará nos próximos anos. Tendências internacionais sugerem que a legislação sobre saúde mental no trabalho tende a se tornar progressivamente mais específica e abrangente, com requisitos mais detalhados e mecanismos de fiscalização mais robustos.
No contexto brasileiro, é provável que vejamos, nos próximos anos:
- Desenvolvimento de normas técnicas específicas sobre avaliação e gestão de riscos psicossociais;
- Fortalecimento dos mecanismos de fiscalização, com capacitação específica dos auditores fiscais do trabalho;
- Jurisprudência crescente sobre responsabilidade empresarial em casos de adoecimento mental relacionado ao trabalho;
- Integração mais explícita entre a legislação trabalhista e previdenciária no que tange à saúde mental.
Esta evolução normativa será influenciada tanto por pressões sociais e evidências científicas quanto por tendências internacionais e compromissos assumidos pelo Brasil em fóruns multilaterais como a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Impactos no Mercado de Trabalho
A crescente atenção aos riscos psicossociais tende a influenciar significativamente o mercado de trabalho brasileiro. Empresas que se anteciparem às exigências legais, desenvolvendo ambientes psicologicamente saudáveis, provavelmente desfrutarão de vantagens competitivas na atração e retenção de talentos, especialmente entre as gerações mais jovens, que tendem a valorizar o bem-estar no trabalho.
Por outro lado, organizações que resistirem às mudanças poderão enfrentar não apenas sanções legais, mas também dificuldades crescentes para manter sua força de trabalho e preservar sua reputação no mercado. Esta dinâmica pode acelerar transformações nas práticas de gestão, mesmo além do que é estritamente exigido pela legislação.
Adicionalmente, é provável que vejamos o surgimento e fortalecimento de novos nichos profissionais especializados em saúde mental no trabalho, como consultores em riscos psicossociais, especialistas em bem-estar organizacional e peritos em nexo causal entre trabalho e transtornos mentais.
Integração com Outras Tendências
A gestão de riscos psicossociais não ocorre isoladamente, mas se integra com outras tendências significativas no mundo do trabalho, como:
- Transformação digital: A crescente digitalização e automação do trabalho traz novos desafios psicossociais, como hiperconectividade, vigilância digital e diluição das fronteiras entre vida pessoal e profissional.
- Novas formas de trabalho: Modalidades como teletrabalho, trabalho por plataformas e contratos flexíveis apresentam configurações específicas de riscos psicossociais que demandarão abordagens adaptadas.
- Diversidade e inclusão: A crescente diversidade da força de trabalho exige atenção a fatores psicossociais específicos que afetam diferentes grupos, como discriminação, microagressões e barreiras à inclusão.
- Sustentabilidade: A integração da saúde mental na agenda ESG (Environmental, Social and Governance) das empresas, reconhecendo seu papel na sustentabilidade social das organizações.
Esta integração complexa sugere que a gestão de riscos psicossociais não pode ser tratada como uma iniciativa isolada, mas deve ser parte de uma abordagem holística para a transformação das organizações e das relações de trabalho.
Conclusão
A atualização da NR1, com a incorporação explícita dos riscos psicossociais em seu escopo, representa um marco significativo na evolução da legislação trabalhista brasileira. Esta mudança reflete um reconhecimento crescente da indissociabilidade entre saúde física e mental, bem como da responsabilidade compartilhada de empregadores e trabalhadores na promoção de ambientes laborais saudáveis e sustentáveis.
Do ponto de vista jurídico, a norma estabelece um arcabouço claro de direitos e deveres, com requisitos específicos para o gerenciamento de riscos ocupacionais em sua totalidade. A abordagem processual e sistemática adotada, com ênfase na prevenção e na melhoria contínua, representa um avanço significativo em relação a abordagens anteriores, frequentemente formalistas e reativas.
Na perspectiva humana, a norma tem o potencial de catalisar transformações profundas nas relações de trabalho, promovendo culturas organizacionais mais saudáveis e sustentáveis. Ao reconhecer formalmente a importância da saúde mental no ambiente laboral, a NR1 atualizada contribui para a desconstrução de estigmas e para a valorização do bem-estar integral dos trabalhadores.
Os desafios para implementação efetiva são significativos e não devem ser subestimados. Superar resistências culturais, desenvolver competências técnicas e integrar a gestão de riscos psicossociais com outras políticas organizacionais demandará esforços coordenados e persistentes. No entanto, os potenciais benefícios – tanto para trabalhadores quanto para organizações – justificam amplamente estes esforços.
Em última análise, a NR1 atualizada não representa apenas uma obrigação legal a ser cumprida, mas uma oportunidade para repensar fundamentalmente as relações de trabalho, alinhando-as com valores de dignidade, respeito e sustentabilidade. Neste sentido, sua implementação efetiva não é apenas uma questão de conformidade legal, mas um imperativo ético e estratégico para organizações que aspiram a prosperar no mundo do trabalho contemporâneo.
Referências
- Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria MTb nº 3.214, de 08 de junho de 1978. Aprova as Normas Regulamentadoras – NR – do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas a Segurança e Medicina do Trabalho.
- Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria MTE nº 342, de 21 de março de 2024. Altera a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) – Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Ocupacionais.
- Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria MTE nº 344, de 21 de março de 2024. Altera a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) – Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Ocupacionais.
- Brasil. Ministério do Trabalho. Portaria 1.419/24. Estabelece diretrizes para a implementação da NR-1 atualizada.
- Exame. Nova NR-1 passa a valer em maio deste ano; norma terá foco em saúde mental e multará empresas em 2026. Disponível em: https://exame.com/carreira/nova-nr-1-passa-a-valer-em-maio-norma-trara-foco-saude-mental-e-multara-empresas-em-2026/. Acesso em: 21 mai. 2025.
- Vidalink. Atualização da NR-1: tudo o que você precisa saber. Disponível em: https://vidalink.com.br/blog/atualizacao-da-nr-1/. Acesso em: 21 mai. 2025.
- Canal da Ética. O que mudou na NR-1 para 2025? Veja como adaptar sua empresa. Disponível em: https://canaldaetica.com.br/blog/o-que-mudou-na-nr-1-para-2025-veja-como-adaptar-sua-empresa/. Acesso em: 21 mai. 2025.
- Organização Internacional do Trabalho. Riscos psicossociais e estresse no trabalho. Genebra: OIT, 2022.
- Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República.
- Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho.